A mobilização das entidades cientificas e acadêmicas, especialmente Anfope e Forumdir, vem se intensificando como resposta necessária ao processo de destruição e desarticulação dos cursos de formação de professores desencadeado pelo Conselho Nacional de Educação desde 2017, conforme temos denunciado constantemente neste blog (leia aqui, aqui, aqui). A mobilização se intensifica desde fevereiro deste ano, com o anuncio pelo CNE, das intenções de alterar profundamente a estrutura, concepção, caráter e conteúdo da formação oferecida pelos cursos de pedagogia, caracterizando o que denunciamos como “os caminhos para a destruição da educação e da pedagogia” (leia aqui), incluindo as próprias Faculdades de Educação, responsáveis acadêmica e cientificamente pela produção de conhecimento na área da educação e da formação de professores.
Embora as alterações mais significativas no âmbito dos cursos de pedagogia tenham ocorrido já na Res. 02.2019 que instituiu a Base Nacional Comum da Formação Inicial de Professores, as proposições anunciadas pelo CNE em 10 de fevereiro, a aprovação da Base Nacional Comum de Competências do Diretor Escolar em 11 de maio pp. em prazo recorde e separada da discussão das DCNs dos Cursos de Pedagogia acendeu o alerta em relação a novas regulações que confirmam, como analisamos em posts anteriores, a intenção de retomada do Curso Normal Superior (leia aqui), proposta derrotada pelo movimento dos educadores ao final do século passado no período pós-LDB. Ao mesmo tempo, a reforma do Ensino Médio, ao introduzir os itinerários formativos, aprofundando a dualidade histórica desse nível de ensino, criou a possibilidade do Itinerário Educação, hoje materializado como Vivências Docentes em estados como MG, ES e em SP onde se pretende formar o técnico em educação ou o assistente de professor, o que anuncia profundas alterações na formação docente. (leia aqui)
Considerando este contexto, ANFOPE – Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação e FORUMDIR – Fórum Nacional de Diretores de Faculdades, Centros e Departamentos de Educação das Universidades Públicas, apontaram a todas as suas instancias o mês de abril como o tempo de intensificação da mobilização em Defesa do Curso de Pedagogia, travando debates que aprofundaram a critica à decisão do CNE de alterar radicalmente as DCNs dos cursos de Pedagogia aprovadas em 2006, no contexto das alterações propostas pela 02.2019.
Diante do grave quadro que atinge profundamente a autonomia didática, cientifica e acadêmica das Universidades e desconsidera as Faculdades de Educação como instancias acadêmicas e cientificas responsáveis pela produção de conhecimentos na área da educação e das teorias pedagógicas e pela formação dos quadros do magistério para a educação básica, intensifica-se o movimento de resistência propositiva à resolução 02.2019 – conforme definiu a Anfope em seu XX Encontro Nacional de 2021. Resistência a toda a politica de formação de professores de caráter regressivo instituída desde o golpe de 2016 e extensiva àquelas que ainda virão, como as DCNs para o curso de pedagogia, as DCNs das licenciaturas especificas, alterações na carreira docente, avaliação de estudantes e professores e aos processos de acreditação das instituições formadoras submetidas a maior controle e ao crivo do “alinhamento” – BNCC – BNC da Formação – que inclui os programas de pós-graduação destinados a professores da educação básica, conforme o princípio da “coerência sistêmica” presente no Parecer CNE/CP 14.2020 da BNC da Formação Continuada.
Esta resistência e mobilização se amplia significativamente neste momento com a ampla mobilização e participação dos coordenadores de curso, docentes dos NDEs – Núcleos Docentes Estruturantes – e outros professores no Movimento Nacional em Defesa do Curso de Pedagogia, cujo ato de lançamento aconteceu dia 31 de maio. Este movimento, iniciado em abril, com a criação do Fórum de mobilização e defesa dos Cursos de Pedagogia do RJ, conforme noticiamos então neste blog, se estendeu durante o mês de maio para outros estados – como MS, PB, GO, RN.
O ato nacional de lançamento que contou com a participação de dos Foruns dos estados MS, PB, GO, RN e do RJ, docentes e coordenadores de cursos de pedagogia de grande parte das IES dos estados e do DF e com a presença e apoio destacados das entidades academicas e cientificas que desde final da década de 70, compõem o movimento dos educadores em luta pela formação – ANFOPE, ANPAE, ANPEd, Forumdir, CEDES e ABdC. Ao final do ato foi reafirmado o apoio do CEDES e anunciado o apoio da Campanha Nacional pelo Direito à Educação.
Para essa ampla mobilização neste grave momento pelo qual passamos, foram chamados, como afirmou a professora Lisete Jaehn, da UFF e do Fórum do Rio de Janeiro,
… todos os que lutam e se sensibilizam pela luta em defesa do curso de pedagogia, e tem como objetivo situar e contextualizar a Resolução 02.2019 e suas consequências para as licenciaturas e para a pedagogia especialmente, estimular os debates nas regiões pelos cursos, pelas instituições, na articulação interinstitucional e também com as entidades representativas da formação de professores da escola básica e todas as instancias possíveis onde possamos buscar articular caminhos de resistências tanto nas IES quanto no próprio CNE.
Este é um movimento dos cursos, das instituições, das entidades e da sociedade
…chamamos para a responsabilidade deste coletivo para lutarmos e efetivamente fazermos o que cabe ao curso, o que cabe ao NDE, o que cabe ao colegiado, o que cabe a entidade e o que cabe à sociedade.
A mobilização institucional dos coordenadores de cursos e dos núcleos docentes estruturantes de cada instituição formadora fortalece a resistência institucional na construção de projetos formativos, principio que é muito caro a nós, educadores, na defesa da autonomia didática, cientifica e pedagógica das universidades. Cabe ainda reafirmarmos como a Anfope o faz, em cada momento histórico, de que nenhuma forma de regulação e controle externo – DCNs ai inclusas – pode se constituir camisa de força para as instituições formadoras, cabendo aos seus docentes e estudantes e a suas instâncias acadêmicas construir projetos próprios de formação sintonizados com as demandas e necessidades formativas da educação básica e da escola pública onde hoje está a imensa maioria das crianças de nosso povo.
A defesa dos Cursos de Pedagogia implica em revermos em profundidade os caminhos que trilhamos como coletivo, desde 2006 na organização dos percursos curriculares e formativos dos estudantes de pedagogia mas também de todos os estudantes nas licenciaturas especificas. O fortalecimento da Pedagogia intrinsecamente articulado ao fortalecimento das Faculdades de Educação, supõe analisarmos ainda como os projetos institucionais dos cursos de pedagogia conseguem romper a fragmentação disciplinar e a estrutura propedêutica ainda presente em vários cursos, assim como a materialização da introdução das práticas desde o inicio do curso. Sem cursos de Pedagogia e Faculdades de Educação fortalecidas acadêmica e cientificamente em suas responsabilidades de investigação e de formação, não teremos licenciaturas que possam formar estudantes futuros professores preparados de forma elevada para lidar com os imensos desafios que os próximos anos nos anunciam, especialmente no pós-pandemia, com o o aumento do desemprego, o aprofundamento da desigualdade social e da fome com graves impactos na vida social e na escola e educação pública.
Como afirmamos em abril no lançamento do Fórum Estadual de Mobilização e Defesa dos Cursos de Pedagogia do RJ, esperamos que esta iniciativa seja multiplicada em cada estado, mobilizando estudantes, professores, e os diferentes espaços institucionais na resistência à futura resolução das DCNs dos cursos de Pedagogia. Neste processo é fundamental trazermos também os professores dos Institutos Federais que hoje possuem aproximadamente 60.000 estudantes em cursos de formação de professores – na pedagogia e nas demais licenciaturas especificas.
Juntamente com as entidades acadêmicas e cientificas e as entidades educacionais, temos o desafio de derrotarmos a Resolução 02.2019 pela criminosa politica que agride a autonomia universitária, desqualifica a formação de professores, submete a educação básica à lógica empresarial que aprisiona as escolas mediante processos de maior controle sobre o currículo, estreitando a formação dos estudantes, desqualificando o trabalho docente e a educação oferecida pela escola pública. O projeto de futuro que queremos nos coloca o desafio de anunciá-lo desde já alterando o presente.
Que a resistência aos retrocessos impostos pela logica neoliberal às politicas sociais, à educação e à escola pública em nosso país, duramente atingidas pelas recentes determinações impositivas do CNE sejam a medida do quanto nossas capacidades e potencialidades devem estar dirigidas para a derrota destas proposições não apenas no campo institucional, urgente e necessária, mas de forma articulada, sobretudo no campo politico.
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